Dei com os olhos na notícia do jornal e achei engraçado. Eis que perturbavam os passantes, os “habitués” da fila, “as expansões”, do casalzinho, vai ver que de volta das aulas ou do trabalho. Não ri, nem chorei: como Machado de Assis, admirei-me simplesmente com as turbas.
Ontem, rolava eu pela tarde irrealmente linda de Petrópolis, e, não sei por que, pensava nesses namorados que nunca vi. Pensei em prestar-lhes o meu irrestrito apoio, intenção que ora concretizo, por estas mal traçadas.
Pois que seria de nós, deste complicado mundo, sem vós, namorados, mesmo que sejam estes que tanto reclamam, da fila Erasmo Braga-Urca. Amem-se, expandam-se nas suas expansões, que a ninguém pode fazer mal, mesmo ele sendo muito alto, ela muito baixinha, obedecendo à lei dos contrastes ou ao gênio da espécie. Estamos cansados, neurastênicos, aflitos neste mundo que não sabemos, mas desconfiamos, às vezes, aterrorizados, para onde irá. E um casal se ama, e, se amando, expande-se e se assim se expande às seis horas da tarde, na fila do ônibus, há de ser porque não tem muito lazer nem local para expandir-se em sítio mais cômodo, para eles e para os demais “habitués” da fila.
E fico a pensar em que expansões serão essas dele, muito alto, ela muito baixinha, como fez questão de frisar o reclamante, capaz de tanto perturbar a volta do trabalho desses escandalizados habitantes da Urca.
Não sei, mas estou convosco, ó namorados, ele muito alto etc. etc. O mais que fazeis é estar amando e não é coisa que geralmente faça mal ao próximo. Amando, no Rio de Janeiro, no Brasil, a inflação subindo quatro vírgulas não sei quanto cada mês, cápsulas espaciais a despencarem dos ceús, guerra no Vietnã, aflições e desconfortos vários. E vós ainda vos amais, um ao outro, numa fila humilde de ônibus, entre cinco e seis horas da tarde, vai ver que cansados da lida do dia.
Amem-se, expandam-se, doa a quem doer, que não há de doer muito. Digam o que disserem,é um dos belos ofícios que se pode exercer, neste triste mundo, este de amar e expandir-se. Mesmo sendo “ele muito alto, ela baixinha”.
Elsie Lessa, "Crônicas de Amor e Desamor"
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