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Cinquenta anos atrás, quando se esmerava para escrever seus sonetos, ele os classificava em duas categorias: os românticos e os realistas. Na época, eles ainda não se dividiam em dolosos e culposos.
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Que todo sacrifício imposto pela literatura seja assumido pelos escritores e que eles resistam à tentação de repassá-los aos leitores.
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Enquanto o poeta social se identifica apresentando a carteirinha do sindicato, o poeta comum continua dependendo do testemunho dos passarinhos e dos seus colegas de confraria.
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É um desses poetas que, numa antologia de quinze, fazem sempre pensar que com catorze ela ficaria bem melhor.
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Na ideia de imortalidade do escritor municipal não há uma passagem por Estocolmo. Há uma reunião na câmara de vereadores e uma votação que lhe garantirá uma estátua na praça central. Isso lhe bastaria. Se pudesse pedir algo mais, seria que o pusessem de frente para o pequeno lago.
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Ando tão diverso, já, de modos e de feições, que a Morte, se me aceitar, há de ser com restrições.
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Estou num momento mau, que péssima fase a minha. Minha alma virou mingau, e meu cérebro, farinha.
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Eu nasci triste. Isso fez de mim um menino orgulhoso. Repugnava-me o riso dos adultos, como quase tudo que lhes era próprio. Horrorizava-me pensar que logo eu seria um deles. Quando descobri a literatura, escravizei-me aos personagens atormentados, aos miseráveis, aos ressentidos e aos derrotados. Ela nunca me falhou. Até hoje me dá o pão amargo que me alimenta.
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Tem uma convicção: a de que um poeta presunçoso jamais receberá a visita de um haicai.
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Quando, cinquenta anos depois, abriu a gaveta onde estavam guardados os sonetos de sua juventude, decepcionou-se. Tinha lido já o terceiro e seus olhos permaneciam obstinadamente secos.
Raul Drewnick
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