Desde que decidimos nos separar, diariamente fazemos o check-up emocional um do outro. Acordo quase sempre com um “sobrevivendo aí?”, e ele vai dormir com a mensagem: “qualquer coisa tô por aqui”.
Separar é a coisa mais difícil que eu já fiz na vida, e olha que eu fiquei 42 horas tentando ter um parto normal. E olha que eu já fui a filha pequena de pais se separando. E olha que meu apelido na escola era “Fabi feia” (eu era a cara da popular Fabi, mas na versão mundo bizarro). E olha que na infância eu tentava conversar com adultos sobre como eu era angustiada e me mandavam parar de pensar besteira e comer –e então eu fui um tantinho anoréxica por mais de uma década. E olha que em 2012 meu pai descobriu um câncer no dia em que um cara por quem eu era alucinada de paixão me disse: “Foi tudo tanto e tão rápido que não dei conta” (e já tinha ouvido essa frase mil vezes antes e ouviria mil vezes depois e morreria em todas as vezes, porque eu gostaria de poder ser amada pelo menos uma vez na vida sendo “tanto e tão rápido”). E olha que eu já estive em um avião que arremeteu duas vezes e as comissárias se deram as mãos. Enfim, nada, até hoje, foi mais doloroso e complicado do que este exato minuto. Hoje descobri que tenho um armário enorme e inteiro para espalhar minhas roupas novas e cheias de más intenções, mas passei as últimas seis horas olhando para esse vazio e pensando que ele é todinho meu peito.
Pedro é minha família e vai ser para sempre. É o que repito no banho, durante o jantar, dirigindo o carro, quando choro tanto que entro numa espiral de soluços, espirros e soquinhos no esterno. Na semana em que me separei, parentes me ligaram para perguntar se não valia a pena eu aguentar até minha filha ter cinco anos, idade que eu tinha quando quando meus pais se divorciaram: “Você ficou tão bem”. Fiquei? Na semana em que me separei, parentes quiseram saber quem traiu quem, quem estava mais abatido e como eu dormia sabendo que, a cada três dias, minha filha se apertava num quarto de hotel enquanto eu caminhava por um apartamento confortável. Não aguento falar com ninguém. Minha única família é justamente o homem de quem eu estou me separando. Solidão em dezembro é para os muito fortes.
Na semana passada, resolvemos montar a árvore de Natal junto com nossa filha. Porque seria positivo pra ela, porque seria divertido pra nós (oi?) e porque eu liguei para o Pedro dizendo que não estava conseguindo respirar. A cada enfeite que eu colocava, ia para o banheiro e chorava tanto que, se meu muco nasal valesse alguma coisa, eu estaria na próxima lista da Forbes. Não foi positivo pra Rita, e sinto muito. “Mamãe não devia ter uma síncope lacrimal na sua frente, mas mães são feitas pra cagar a psique dos filhos e depois colocar na terapia, tá tudo bem.” Rita aprendeu nesse dia que eu amava o pai dela mesmo não querendo mais morar com ele. Agora é complexo, mas um dia tal informação lhe servirá de algo.
A gente tentou se separar dezenas de vezes alegando falta de amor e no dia seguinte continuávamos juntos. Pedro é meu melhor amigo, meu pai, meu irmão, meu filho, meu personagem (desculpa por tudo que você teve que aturar e obrigada por entender que eu sou uma escritora, você foi o único até hoje!) e, por muitos anos, o cara com quem eu flertava nas festinhas até perceber que era meu marido. Quando finalmente decidimos nos separar apesar de tanto amor, conseguimos.
Colamos nossas mãos com uma espécie de “superbonder eterno e invisível”, e agora elas conseguem tatear sozinhas o futuro. Todo dia é inacreditável, mas a gente se liga chorando e fala: “Caceta, que dor do inferno!”. Até pra suportar ficar sem você, é você quem me faz companhia. Essa é a história de um casamento que deu certo.
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