sexta-feira, outubro 3

No sebo, o melhor apreciador


O sebo é onde o livro encontra o seu verdadeiro apreciador. Intacto com as páginas precisando ser abertas com espátula, ou todo estropiado, espera sua vez de se mostrar. Quando já usado, o leitor quase que transformou o livro em um objeto artesanal. No sebo, o livro está bem próximo de um manuscrito que registra a passagem do leitor no rastro do autor. Há os anotados, assinalados a lápis ou caneta – se depender do tempo, com antigas canetas de pena; com recortes de jornais sobre o autor e papéis de todo tipo marcando a página preferida. Uns mais antigos, marcados com uma flor, carregam amor entre papéis esquecidos. 

Nem faltam cartas e documentos, que as páginas se tornaram guardiães de segredo de cofre e coração (E aquela carta de amor endereçada a um escritor que a leitora deixou de enviar, mas guardou secretamente no livro autografado?). Tudo acaba esquecido entre páginas como marcador ou apenas foi esquecido depois de escondido. Silencioso, em suas páginas, o livro pode guardar qualquer segredo.

O livro tem um destaque especial quando foi manuseado por um ou mais leitores. É possível seguir o rastro de como foi tratado desde seu primeiro comprador. Agredido por crianças ou insetos, está lá o livro marcado pelos rabiscos e algum furo de cupim, que talvez tenha deixado até manchas. Outros carregam marcas do dono como ex-libris. Nos antigos, sequer faltam os selos dos encadernadores. Tempos em que os volumes eram encadernados e ficavam em fileiras nas estantes, com lombadas. 


Os segredos dos leitores são revelados apenas para o livreiro. Fiel depositário de tanta vida, fecha o livro e deixa que vá para a prateleira. O livro levará para bem longe o que guardou tanto tempo. Na distância, tudo vai se perder e o segredo estará garantido.       

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