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Ela acorda cedo, abre a janela e chama o sol. Ele, cãozinho obediente, sempre vem, com a cauda abanando. Ela sabe como o sol a ama. Não sabe que nessa hora em que diariamente atrai o sol para o seu terraço eu vou finalmente dormir, depois de mais uma noite de tenebrosa insônia. Ela não sabe como a amo, ou – se sabe – não gosta de meu pelo, de meu focinho, de minha cauda desgraciosa, de meu modo de latir. Nunca me chamará.
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Quando o sol vai indo, como agora, lembro-me da mania que tive, quando menino, de colecionar besouros, moscas, tatuzinhos. Tentei várias vezes, na época, enfiar na caixa de fósforos um pouquinho de sol. Não tive sucesso, nunca, mas sinto-me disposto hoje a repetir as tentativas. Talvez guardar um raio de sol seja algo que eu possa juntar a outras conquistas da chamada terceira idade, como o direito de entrar na fila especial no banco e receber aquele sorriso solidário quando dou meus tropeções na rua.
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Não, não foste o sol daquela manhã, embora calhasse bem dizer aqui que foste. Eram quase dez horas, já, e o sol, assim como eu, fazia muito que te esperava – ele com seus decantados raios fúlgidos, eu com meu coração alvoroçado.
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