sexta-feira, novembro 22

Manhã

Não tive uma vez uma juventude amável, heroica, fabulosa, a ser narrada sobre folhas de ouro – muita sorte! Por que crime, por que erro, mereci minha fraqueza atual? Os que creem que os animais têm soluços de pena, que os doentes desesperam, que os mortos tenham maus sonhos, tratem de contar a minha queda e o meu sono. Eu não posso me explicar mais que o mendigo com seus contínuos Pater e Ave Maria. Não sei mais falar!


Porém hoje creio ter terminado o relato do meu inferno. Era o inferno; o velho, de que o filho do homem abriu as portas.

Do mesmo deserto, à mesma noite, sempre meus olhos cansados se abrem para a estrela de prata, sempre, sem que se comovam os reis da vida, os três magos, o coração, a alma, o espírito. Quando iremos, além das praias e dos montes, saudar o nascimento do trabalho novo, da sabedoria nova, a fuga dos tiranos e demônios, o fim da superstição, adorar – os primeiros! – O Natal na terra!

O cântico dos céus, a marcha dos povos! Escravos, não amaldiçoemos a vida.

Arthur Rimbaud, "Uma temporada no inferno"

Nenhum comentário:

Postar um comentário