"O encadernador era um homem meio velho, e no princípio, eu
achava que era por isso que ele ficava meses com cada livro que a gente levava
pra ele encadernar.
Até que um dia eu descobrir que ele era um outro dos nossos:
leitor também. Só que ele não comprava livro; só lia livro que ia se tratar com
ele. E se ele gostava do livro, como eu tenho certeza que ele gostou do Rilke,
aí mesmo é que ele ficava com o livro toda a vida. Pra ir relendo cada vez que
dava vontade.
Ele torceu o nariz quando viu o livro assim todo despencado
e rabiscado, Mas fez o trabalho; costurou as páginas todas; botou capa dura
verde escuro; botou letrinha dourada na lombada, que eu achei que não precisava
não. Mas ele era assim: lombada/ precisa letrinha dourada. Fez um trabalho muito
bem feito mesmo. E lá um dia me telefonou dizendo que o livro tinha tido alta.
Eu fui lá buscar ele, e foi tão gostoso a gente voltar junto
pra casa. E ficar ali de novo, só nós dois, eu repassando carta por carta dele.
Foi um reencontro muito bonito."
(Trecho sobre encadernador de Lygia Bojunga Nunes em “Livro,
um encontro com Lygia Bojunga Nunes”)
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