Osvaldo Raúl Alvarez |
Quando voltou, tomou mais uns dois goles extras de uísque para enganar o frio, tirou as roupas até ficar só de ceroulas, foi para a cama, leu um artigo numa velha Argosy sobre um mercenário no Amazonas que fora adotado por uma tribo de caçadores de cabeças, casara-se com as graciosas filhas gêmeas do cacique, tivera cinco filhos e andava pelado até os missionários chegarem, e com eles o inferno e todas as nossas escapadas ousadas do fogo eterno. Não achou a matéria muito ruim, mesmo que fosse besteira. Apagou a luz e adormeceu.
Estava sonhando com as adoráveis irmãs gêmeas se aconchegando no seu corpo quando a lua cheia se ergueu sobre o rio, ofuscante e limpa. Ouviu um choro abafado, uma criança no outro quarto, anos atrás, e aí ouviu seu nome sussurrado, talvez Miúdo tentando acordá-lo, ou uma das belas filhas do cacique murmurando seu nome no sono. Escutou atentamente na escuridão, uma concentração que parecia tirá-lo de si mesmo em uma suspensão vazia. Escutou o próprio coração parar de bater, o último encher de pulmões deixá-lo em um silêncio luminoso. Esperou, totalmente quieto. Escutou seu choro suave retornar em sua carne, desvanecendo-se em direção à lua. E então um sussurro de asas enquanto era erguido.
Podia sentir, pelo jeito como era levado, que não se tratava de anjos, não podia conceber que fossem anjos, tinha tanta certeza de que eram patos, que nem se incomodou em abrir os olhos. Pacientemente, fez um último esforço para conseguir mais uma batida de coração, mais uma respirada, e então lhes disse com teimosia e ênfase, sem demonstrar nenhum arrependimento ou pesar:
– Ora, com os diabos, fui imortal até morrer.
Esperou, mas não houve mais respiração. Sucumbiu por si mesmo, relaxou e deixou que o levassem.
Jim Dodge, "Fup"
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