Recente seminário
organizado e realizado pelo SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros) no
dia 17 de novembro para discutir questões relacionadas ao preço fixo trouxe
grandes esclarecimentos ao setor editorial. A numerosa e seleta plateia pode
ouvir relato das experiências da Inglaterra (não tem lei do preço fixo de
livro), França e Alemanha (adotam o preço fixo de livro), além de informações
sobre o setor no Brasil. Não é o caso, agora, de discutir os prós e contras do
regime, cada posição apoiada em argumentos sedutores. O fato, nesse particular,
é que uma discussão aberta e racional se iniciou, levando em conta basicamente
(a) as peculiaridades do país (analfabetismo e situação geográfica) e do setor
editorial brasileiro, (b) as características do mercado, como número de
livrarias, divisão geográfica do mercado, concentração de editoras, (c) as
estatísticas a respeito da produção e consumo editorial brasileiros, e (d) a
demora e imprevisibilidade da tramitação legislativa de um projeto de lei.
Destaque para a resposta do representante da França, que disse, indagado sobre
determinada conduta naquele país: “Ora, se existe lei é para ser cumprida”!
A postura do SNEL foi
feliz e muito sensata ao conduzir um debate com pés no chão, um mínimo de
informação, através de conversa franca e aberta com postura altamente
democrática e polida.
O ponto que gostaria de
destacar, no entanto, permeia essa discussão e diz respeito, mais
especificamente, a um deslocamento de eixo em termos jurídicos, para o leitor.
Minha exposição se limitou a destacar os conceitos legais do setor editorial,
como editor, livreiro e, mais discretamente, distribuidor, na Lei de Direito
Autoral (LDA) e na do Plano Nacional do Livro e Leitura, e fazer pequena
reflexão a respeito, já que não temos lei do preço fixo. Em disposição isolada,
mas significativa, a LDA atribui ao editor a decisão sobre o preço a ser
cobrado pelo livro.
Assim, como dizia, o
foco sobre o preço fixo é um sinal forte da maior atenção jurídica dada ao
leitor, pois o “autor” e “editor” já estão bem regulados nas leis. Tema
discutido no seminário como, infração à ordem econômica, venda abaixo do preço
de custo, penalidades, concentração de mercado, grandes redes livreiras, dizem
respeito à proteção ao mercado e ao leitor, este, em última análise um
consumidor do produto final livro.
Essa atenção é um
indício da ascensão, no mundo jurídico, dessa categoria “leitor/consumidor” no
eixo do setor editorial. A discussão sobre preço fixo do livro engloba todo o
segmento de venda do produto, desde a negociação dos descontos no valor para
venda a livreiros e grandes redes, até chegar a ponta do consumo, a relação com
o leitor.
E na relação com o leitor destaco a mudança que ocorrerá com a
comercialização do livro eletrônico. Já vimos, em artigos anteriores nesse
site, que a forma de acesso ao livro eletrônico se dá por meio de “licença”; o
leitor não compra o livro, mas, sim, adquire uma licença precária de leitura. A
licença constitui vínculo mais tênue, mas quase permanente, do leitor com a
editora, que poderá controlar o tempo de leitura, as anotações feitas pelo
leitor, e até cancelar a licença, se o leitor tentar reproduzir indevidamente o
livro.
Essa nova relação
editora-leitor difere daquela em que se adquire um livro físico – no qual se
consubstanciam o conteúdo e o objeto de papel – que se incorpora ao patrimônio
do leitor, sem qualquer vínculo jurídico com editora, ou com o livreiro, salvo
defeito de impressão ou montagem.
A nova relação
editora-leitor, no livro eletrônico, é muito mais intensa. Enquanto ele tiver
que acessar o livro na nuvem para lê-lo, ou receber atualizações, o vínculo
permanecerá, com direitos e obrigações para ambas as partes. Esse novo eixo,
constitui nova relação jurídica, que pode ser objeto de cobranças por parte do
leitor em relação a disponibilidade do livro, ou utilização de seus dados on
line, etc., e também reclamações por parte da editora contra eventual
reprodução indevida da obra.
O fato é que o leitor
aparece em igualdade de condições com o consumidor e a lei de consumo é muito
mais favorável a esse último, assegurando-lhe prerrogativas inexistentes em
outras relações. Sendo o leitor/consumidor a parte mais “fraca”, a lei procura
equilibrar a relação revestindo de maior força as suas pretensões.
Portanto, é importante
perceber que a discussão sobre o preço fixo do livro está situada no âmbito da
maior atenção, em termos jurídicos, para a relação editora-leitor, que tende a
ser mais regulada doravante.
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