quarta-feira, outubro 21

A barriguinha

De repente, no sétimo ano de um casamento feliz, Luísa começou a ser cutucada pelo espinho da inquietação. Se alguém lhe perguntasse, ela não saberia dizer o que havia mudado no comportamento de Cláudio, mas tinha certeza de que o marido não era mais o mesmo.

Ele parecia tão atencioso como nos primeiros dias do namoro, tão amável como no início do noivado, tão carinhoso como na inesquecível quinzena de lua de mel em Cancún. Ainda beijava Luísa antes de sair para o trabalho e ainda trazia, ao voltar, os braços cheios de abraços para ela. Lembrava-se ainda do dia do aniversário de Luísa e não se esquecia nem da data do aniversário de dona Marta, a mãe dela.

O que havia mudado, então? Essa era a pergunta que Luísa vinha se fazendo nos últimos dois meses e, embora se esforçasse para encontrar a resposta, a única alteração que podia honestamente apontar no marido era aquele princípio de barriga que ele tentava de todas as formas ocultar e que ela – para não deixá-lo constrangido – fingia não ver.


Mas ela era capaz de apostar que havia alguma coisa além daquela saliência que já nenhuma camisa ou pulôver conseguia disfarçar. E era essa coisa que agora enchia de desconfiança os seus dias. Consultada, dona Marta censurou a filha:

– Quando é que você vai perder essa mania de inventar problemas? Faz sete anos que você está casada com esse homem e ainda não percebeu que ele é ouro puro?

Essa conversa com a mãe fez Luísa ser tomada por um alívio e por uma calma que duraram meia hora, talvez um pouco mais. Depois, o espinho da suspeita voltou a atormentá-la, mais agudo do que nunca. E podia ser diferente? Diariamente ela ouvia histórias de separação e recentemente havia lido uma reportagem que falava da maldição do sétimo ano de casamento. Pouquíssimos casais ultrapassavam essa barreira, dizia a revista.

Por isso tudo, certa noite, ela resolveu ficar ainda mais atenta às atitudes de Cláudio. Ele chegou às oito, como todos os dias, e até as onze e meia, quando se deitaram, ela não descobriu nada diferente no marido. Ele devorou o jantar feito por ela, notou que Luísa havia mudado o jeito de pentear os cabelos e disse que tinha gostado muito, elogiou o pudim de chocolate, deixou que ela escolhesse o filme na tevê e, quando foram dormir, pareceu tão apaixonado quanto em cada uma das memoráveis noites em Cancún.

Ela dormiu tranquila, sonhou que era menina e andava de bicicleta nas nuvens e acordou sorrindo. Eram seis horas. Então, com um sobressalto, notou que Cláudio não estava ao lado dela. Era esquisito aquilo, porque o marido costumava se levantar só às sete.

Ela esperou um pouco, imaginando que ele pudesse ter ido ao banheiro. Depois, já quase transtornada, saiu da cama, passou pelo banheiro vazio e, com um horrível pressentimento, caminhou furtivamente até o quartinho da empregada. Dorinha não era jovem, nem bonita, mas…

A porta do quarto de Dorinha estava entreaberta e Luísa viu que ela dormia e – ufa! – dormia sozinha. Uma investigação nos outros cantos da casa mostrou que Cláudio não estava por lá. Luísa resolveu então voltar para o quarto e fazer de conta que não tinha reparado na ausência do marido. Ia ficar de olhos bem abertos, quando ele aparecesse, e não tinha dúvida de que Cláudio ia acabar se traindo.

Às seis e quarenta, ele entrou no quarto e Luísa não conseguiu continuar fingindo que dormia. Sentada na cama, ela o encarou com raiva e já ia exigir uma explicação, quando Cláudio se antecipou:

– Eu preciso contar uma coisa a você, Luisinha.

– O que é? – ela perguntou rispidamente, já achando que não tinha feito bem a vistoria no quarto de Dorinha.

– Eu vou entrar numa academia.

– Academia? – espantou-se Luísa. – Academia de quê?

– De ginástica. Sabe o que é? Eu estou engordando, engordando, e acho que, assim, você vai acabar me dando um fora. Hoje eu levantei cedo para ver se corria uma horinha e queimava umas calorias, mas não aguentei nem vinte minutos. Eu não tenho força de vontade. Nunca tive. Mas numa academia talvez eu…

Luísa não o deixou concluir a frase. Pulou da cama e o abraçou forte, bem forte. Ele estava com uma bermuda velha e apertada e aquele par de tênis ridículo, que fazia muito tempo não usava, mas ela não disse nada. Beijou-o, beijou-o muito. Só depois pensou que, se Cláudio fosse mesmo entrar em uma academia, ela ia precisar dar uma passadinha com ele em uma loja de material esportivo.
Raul Drewnick

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