Em São Paulo, descobri que as padarias não vendiam apenas pão. Eram uma instituição, parte essencial do cotidiano. Assim que cheguei e fui viver em um apartamentinho na esquina das ruas Bresser e Silva Telles, na primeira manhã, desci para comer pão com manteiga e café com leite. O balconista perguntou: pão na chapa? Média ou pingado? Começava minha aventura na selva paulistana. Na chapa? Média, pingado? Boiei, fiquei a olhar. Primeira lição sobre um clássico das padarias, o pão na chapa. A média veio não em xícara, mas em um copo americano, que já foi exibido no MoMA de Nova York como exemplo do design brasileiro, e que vendeu, desde 1947, 6 bilhões de unidades. Como poderia eu, em 1957, imaginar que no futuro escreveria para DBA a história da vidraria Nadir Figueiredo, que criou o copo?
Dali até hoje, foram mais de mil pães na chapa e centenas de padarias que frequentei, incluindo algumas em Berlim, onde eu ficava alucinado com a quantidade de pães de todos os tipos e formatos.

Ali ouço gente que pede pão branco, branquinho, pardo, moreno, quase negro, bisnagas, broinhas, suco de melancia com abacaxi, laranja com mamão, açaí com leite. Variações infinitas de gostos e tipos. Bem passado, mal passado, cru, churrasco com cebola. Um chapeiro tem ouvido absoluto para captar ordens gritadas e ter memória de elefante para nada esquecer, incluindo a ordem dos pedidos. O dia de uma padaria começa com o café da manhã, as cervejas e caipirinhas do almoço, os marmitex, os lanches, a calmaria da tarde, domésticas indo buscar queijo, presunto, pizza salame, peito de peru, para os lanches da noite.
Estou no bairro há quase onze mil dias e passei boa parte deles na CPL. José Dias, que conduz a padaria, virou parente, irmão amigo de fé, camarada. Há anos, começaram as queixas, José, reforme a padaria. Reforme, não dá. E então, na pandemia, a reforma se deu, e o que está no lugar é outro lugar. Branco, iluminado, vitrines modernas, uma foto do estádio da Portuguesa, outra da CPL antiga, histórica. Levei um susto há dez dias. Voltando de Minas Gerais, dei com enorme foto minha, entronizada, junto a uma minicrônica poética sobre o que são as padarias para esta cidade. E a legenda: imortal de duas academias, a Brasileira e a Paulista. Já tenho uma placa junto à mesa em que sempre me sento no restaurante Genova, um prato a mim dedicado no Pasquale, o Orecchiente 37, alusão a minha cadeira na Paulista. Sem esquecer o salão das Coxinhas de Bueno de Andrada que leva meu nome. Afagos em vida. Quentes como devem ser, nada de glórias frias, disse Lygia Fagundes Telles.
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