Sem perceber, foi colecionando relógios, até que o apartamento transformou-se na casa do tempo. A mania começou lá atrás, quando ainda solteira era senhora do próprio salário de funcionária pública. Com ele, comprou de um colega um Seiko de contrabando, que até hoje funciona na caixa de joias. Também adotou o modelo desenhado por Santos Dumont que atrizes do cinema usavam na vida real.
Mais tarde, adquiriu um Technos de última geração e, anos depois, um Mondaine grande e dourado que todas as garotas exibiam no pulso. Mais ou menos na mesma época, descobriu numa loja de presentes um relógio de parede parecido com os das estações de trem. O mostrador podia ser visto dos dois lados e ficava pendurado a uma haste de metal escuro. Instalou a peça junto ao batente da porta do escritório, mas o mecanismo logo apresentou defeito. Não adiantou mandar consertar na relojoaria: a pane se repetiu, então, o relógio virou apenas um interessante objeto de decoração.
Na viagem para a Europa, de passagem pela Espanha viu em uma vitrine a réplica do relógio escorrido de Salvador Dalí e não resistiu. Está debruçado em uma prateleira, desafiando a gravidade e o conhecimento dos visitantes. Após alguns anos, também deixou de funcionar, mas continua à mostra.
Veio a moda dos relógios de parede com correia de couro. Demorou a achar um com as dimensões ideais para a sala pequena e hoje ocupa a parede, cumprindo seu papel. Reformou a cozinha e achou que precisava saber as horas, quando cozinhava. Encomendou on line um redondo com números de design moderno que combinou com a mobília.
Percebeu que, agora, tinha relógios por quase toda a casa, só escapando o quarto de dormir, o banheiro e a área de serviço. Quando tudo é silêncio, consegue ouvir os passos dos ponteiros aqui e ali. O despertador foi assumido pelo celular. É o tempo, que nunca para, fazendo a vida andar.
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