segunda-feira, fevereiro 2
Leitor fiel
A noite chega cedo com as chuvas de verão. A parte velha da cidade fica debaixo de água; regatos correm pelo meio-fio. A livraria recebe freguês costumeiro. De boina e capa de chuva, saúda da porta o livreiro lá no fundo. Olha aqui, consulta ali. O leitor passeia pelas estantes. Os olhos cobiçam todos os livros – ah, quem nunca desejou todos os livros do mundo não é leitor.
Gente de casa e amante de livros é perigo na certa para o livreiro. Olho mais atento para eles. Conhecem as obras, sabem o lugar de cada uma. De uma memória fotográfica, reconhecem o que querem pela lombada mesmo que as letras já estejam quase apagadas; sabem direitinho que livro novo entrou na prateleira. Enfim, não escapa nada ao olhar de águia que anos de vivência entre estantes desenvolveram.
Com a chuva que se foi, ao fechar, também o livreiro viu que se foi uma edição ilustrada de um clássico. Coube no bolso da capa, onde viajou abrigada da chuva para outra estante. E lá ficou anos limpa, lida e relida. Mãos melhores e leitor mais fiel não poderia encontrar.
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