Há quantos anos ocorreu essa notícia ? Tão difícil é responder a essa pergunta como predizer quando chegará o momento de escrever a última grande reportagem sensacional: a do Juízo Final, que será uma espécie de balanço definitivo da humanidade. Mas antes que chegue essa hora, quem sabe quantas modificações sofrerá o jornalismo, essa incomodativa atividade que começou quando um vizinho contou a outro o que fez um terceiro na noite anterior, e que tem uma curiosa variante nas nossas aldeias , onde um homem que lê os jornais todos os dias comenta por escrito a notícia, num artigo com inequívoco tom editorial ou no ligeiro e insignificante estilo de uma crônica, segundo a sua importância , e o lê nessa tarde na farmácia, onde a opinião pública se considera no dever de sentir-se orientada.
Esse comentador do fato quotidiano, que pelo menos se pode encontrar em quarenta por cento das nossas aldeias, é o jornalista sem jornal, um homem que exerce a sua profissão contra a dura e inalterável circunstância de não ter sequer uma prensa de mão para expressar as suas ideias e as expressa na via pública, com tão evidentes resultados que talvez essa seja uma demonstração incontroversa de que o jornalismo é uma necessidade biológica do homem , que por isso mesmo está em condições de sobreviver inclusivamente aos próprios jornais. Haverá sempre um homem que leia um artigo à esquina de uma farmácia, e sempre - porque é essa a graça - há de haver um grupo de cidadãos disposto a escutá-lo, mesmo que seja para sentir o democrático prazer de não estar de acordo.
Gabriel García Márquez 10 de Agosto de 1954, El Espectador
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