Ficou entubado alguns dias. Estado crítico extremo. Certamente mais um abatido pelo coronavírus. Naquele dia, o número de mortos atingira mais de cem. Um pico que aterrorizava. Faziam os preparativos para levá-lo para a cova. Faltava ser enrolado com o lençol.
Via tudo. Os olhos bem abertos. Gritava, mas ninguém ouvia sua voz. O último grito abalou os nervos, tremeu a cama, assustou o médico e a enfermeira. Mexeu com a pestana. Estava vivo. O médico mandou que ele voltasse para a Unidade de Terapia Intensiva.
Mais alguns dias, a melhora era sentida, visivelmente. Até que recebeu alta. Saiu numa cadeira de rodas, uma coroa de flores na cabeça. Palmas nos corredores pelo pessoal de frente no combate ao coronavírus. Estava ávido para receber um beijo da mulher, abraço dos filhos e amigos lá fora. Era o primeiro vencedor no hospital da doença tão terrível.
Se um venceu, outros terão o mesmo final, pensou o médico plantonista. Até que descobrissem a vacina para o desfecho da guerra vencida. Do lado de fora, a mulher não conteve a emoção de vê-lo recuperado. Ali mesmo desmaiou, teve uma dor no coração e morreu.
Era a revanche da indesejada, que nunca se dá por vencida. Infelizmente.
Apesar dos pesares, lá naquele lugar onde a esperança não morre ainda se crê nessa manhã em que o sol voltará a brilhar.
Cyro de Mattos
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