segunda-feira, agosto 7

O nome das coisas

Quando o velho poeta disse tristemente que tinha dissipado a vida com sonetos, o repórter fez duas perguntas. A primeira foi: o que era dissipar; a segunda, o que eram sonetos.

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Nos seus últimos dias, ainda se dizia poeta, mas só a si mesmo, e com a voz furtiva de quem confessa uma infâmia ou uma derrota.

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Não há mais loiras longilíneas e langorosas em sua vida. Foram-se todas; restaram só as aliterações.

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A literatura pode tornar-se uma obsessão. Você perderá o apetite, o sono, e os amigos que conservar terão também apetite ruim, sono difícil e, como você, sonharão com baleias assassinas e insetos gigantescos. Não se preocupe. Quem entende do assunto diz que não chegam a ser maus sinais.

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Ninguém sabe melhor que eu a cor dos olhos de minha tristeza, quando chora.

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Quando ela diz rosa, um murmúrio de pétalas perfuma o ar.

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O viço é uma artimanha do tempo.

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A gramática é a tia velha que exige que todos, parentes ou não, saibam que o nome dela é Maria Campos das Dores e não Maria Jardim das Flores.

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Nunca neguei alegria aos meus personagens. Eu os fiz beber, sorrir, subir em mesas, sapatear, rir o riso dos idiotas e dos tresloucados. Mas, quando precisavam de um rosto transtornado pelo infortúnio, não lhes dei tudo que podia. Sempre tive ciúme de minha tristeza.

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O poeta concretista mudou de ares. Saiu do sobradinho romântico e mora agora na cobertura de um edifício de quarenta andares.

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