Cássio Grinberg
quarta-feira, setembro 20
Dono de quem?
O cão, que pensava ser dono de seu dono, que o via correr ao menor ganido (e afagá-lo a qualquer momento), teve, naquela tarde, uma surpresa: constatou, da maneira mais patética que um cão poderia fazê-lo, sofrendo como o cão mais desgraçado da quadra sofreria ante àquilo, que era preterido em função de uma garota. e não adiantaram apelos chantagistas, olhares tristes ou abanar de rabos, pois o olhar que o rapaz propôs à garota que entrava em seu quarto dizia tudo. O olhar tinha cheiro de paixão, e o cão bem sabia distinguir os cheiros. E havia o aroma que brotava daquele pescoço, um pescoço liso como a pele de uma relva, interrompido por uma fina corrente que mal separava a relva do início do rosto, da tez que era bronzeada mesmo no inverno mais rude, mesmo no vento mais cortante que arrancava folhas das árvores de nossa cidade. Naquela tarde, o cão soube quem era dono de quem, e então não teve escolha: aceitou a porta fechada em sua cara, desceu as escadas pata por pata, saiu ao pátio e ao vento nos pelos, e se pôs a roer, velho e gasto, o osso.
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