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Era um dia lindo d´agosto e ela lá ia caminhando, pisando as pedras da calçada que, aquecidas por um sol abrasador, queimavam os seus velhos pés descalços... Havia dois dias já, que não comia. Sua filha, uma transviada da vida que se afogara no pântano lodacento da prostituição e do crime, pedira-lhe chorando, algum dinheiro para o seu amante... Ela dera-lhe todas as poucas moedas de cobre que possuía...
Das famílias que habitualmente a costumavam socorrer, só uma, por falta de meios, ficara na cidade. Era para a sua porta que se encaminhava. Subiu a escada, bateu, esperou. Um padeiro que descia disse-lhe: - "Aí não está ninguém, tiazinha. Saiu-lhes a sorte grande e foram ontem para fora". Bateu então às portas dos outros andares. Em todos lhe deram a esmola dum carinhoso "Tenha paciência"...
Saiu; foi caminhando até que se encontrou numa ruazinha deserta; sentou-se à borda do passeio e, sem forças já para lutar contra a morte, entregou-se-lhe serenamente...
... Era um dia lindo de agosto e o seu pobre corpo jazia inerte sobre as pedras ardentes da calçada...
Mário de Sá-Carneiro
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