Observei em volta: somos todos adultos, sem contar a menina. Apenas para nós o leão conserva o seu antigo prestígio - as crianças estão em redor dos macaquinhos. Um dos presentes explica que o leão tem as pernas entrevadas, a vida inteira na minúscula jaula. Derreado, não pode sustentar-se em pé.
Chega-se um piá e, desafiando com olhar selvagem o leão, atira-lhe um punhado de cascas de amendoim. O rei sopra pelas narinas, ainda é um leão: faz estremecer as gramas a seus pés.
Um de nós protesta que deviam servir-lhe a carne em pedacinhos.
- Ele não tem dente?
- Tem sim, não vê? Não tem é força para morder.
Continua o moleque a jogar amendoim na cara devastada do leão. Ele nos olha e um brilho de compreensão nos faz baixar a cabeça: é conhecido o travo amargoso da derrota. Está velho, artrítico, não se aguenta das pernas, mas é um leão. De repente, sacudindo a juba, põe-se a mastigar capim. Ora, leão come verde! Lança-lhe o guri uma pedra: acertou no olho lacrimoso e doeu.
O leão abriu a bocarra de dentes amarelos, não era um bocejo. Entre caretas de dor, elevou-se aos poucos nas pernas tortas. Sem sair do lugar, ficou de pé. Escancarou penosamente os beiços moles e negros, ouviu-se a rouca buzina do fordeco antigo.
Por um instante o rugido manteve suspensos os macaquinhos e fez bater mais depressa o coração da menina. O leão soltou seis ou sete urros. Exausto, deixou-se cair de lado e fechou os olhos para sempre.
Dalton Trevisan
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