terça-feira, julho 9

Canto do assassino

No dia em que o delegado trouxe Goodwin para a cidade, havia na cadeia um assassino, um negro, que matara sua mulher. Cortara-lhe o pescoço com uma navalha, de modo que, a cabeça destacando-se cada vez mais para trás, toda ensanguentada ela correra para fora da cabina, dando seis ou sete passos na senda enluarada. À tarde, o assassino apoiava-se às grades da prisão e cantava.

A flor caíra da árvore-do-paraíso, a um canto do pátio da cadeia. Jaziam no chão, grossas, pegajosas, adocicadas, de uma doçura excessiva e moribunda. À noite, a sombra irregular de galhos que agora só tinham folhas estremecia fracamente nas grades de ferro. A janela ficava na sala comum. As paredes caiadas de branco estavam manchadas, com a marca de mãos, rabiscos de nomes e datas, inscrições obscenas, feitas a lápis, com a unha ou com lâmina de faca. Todas as noites, o negro assassino ali se apoiava, o rosto manchado pela sombra das grades nos irrequietos interstícios das folhas. E cantava, em coro, com aqueles que se achavam na cerca lá embaixo.
William Faulkner, "Santuário"

Nenhum comentário:

Postar um comentário