A paisagem indiana não tem volumes, mesmo quando é montanhosa e acidentada; e as suas cores estão quase sempre , envoltas numa luminosidade indireta, remota, flutuante. Sob céus imersos , esta paisagem parece mais uma aparição do que uma realidade. Aparição misteriosa, melancólica, poética, que um vento mais forte poderia ir levando pouco a pouco, juntamente com as nuvens. Na Índia , esta sensação de miragem também abrange as obras dos homens, quando elas são belas e se harmonizam com o ambiente natural. Não há nada mais irreal do que certas cidadezinhas fortificadas que surgem inesperadamente das irreais planícies indianas. Com os seus castelos ameados, vermelhos ou castanhos, cujos contrafortes e torres se empoleiram sobre acrópoles rupestres e leoninas, as suas casas densamente aglomeradas em torno das acrópoles e rodeadas por cinturas de muralhas intactas que serpenteiam para cima e para baixo, por montes e barrancos, estas cidades que não estão junto à estrada, que não temos tempo de visitar e nas quais provavelmente não encontraríamos senão ruínas, pobreza, vazio e silêncio, ficam na memória mais como aparições fascinantes de origem e significado incertos do que como aspectos concretos de uma civilização diferente. Quem as fundou e construiu? O que aconteceu lá? Quando foram prósperas e poderosas e quando declinaram? Na ausência de história, ou melhor do sentido de história na Índia (os indianos têm o sentido dos ciclos cósmicos , não dos ciclos históricos), todas estas perguntas parecem fúteis; e com elas se confirma o carácter de truque mágico que o pensamento religioso da Índia atribui ao mundo dos homens, com as suas glórias e os seus reveses.
Alberto Moravia, "Uma ideia da Índia"
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