quinta-feira, março 3

História de uma flor

Denis Chiasson
Furtei uma flor daquele jardim. O porteiro do edifício cochilava, e eu furtei a flor.

Trouxe-a para casa e a coloquei num copo com água. Logo senti que ela não estava feliz. O copo destina-se a beber, e uma flor não é para ser bebida.

Passei-a para o vaso, e notei que ela me agradecia, revelando melhor a sua delicada composição. Quantas novidades há numa flor, se a contemplarmos bem.

Sendo autor do furto, eu assumira a obrigação de conservá-la.

Renovei a água do vaso, mas a flor empalidecia. Temi por sua vida. Não adiantava restituí-la no jardim. Nem apelar para o médico de flores. Eu a furtara, eu a via morrer.

Já murcha, e com a cor particular da morte, peguei-a docemente e fui depositá-la no jardim onde nascera. O porteiro estava atento e repreendeu-me:

– Que ideia a sua, de vir jogar lixo neste jardim!
Carlos Drummond de Andrade

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