Era costume generalizado em Minas que as famílias se reunissem lá pelas duas e meia da tarde para o “café da tarde”, que constava de café, leite, pão de queijo, biscoitos, rosca, queijo, manteiga. Quando era tempo de alguma fruta, o café da tarde era substituído pela dita fruta. No tempo das laranjas eram as laranjas. Nós nos reuníamos no quintal, assentados em tamboretes, tendo uma cesta de laranjas no meio, cada um com uma faquinha. E aí íamos chupando. Tinha inveja do meu pai. Ele descascava as laranjas com perfeição. As cascas saíam inteiras, sem que as laranjas fossem feridas. As cascas eram guardadas. Meu pai, campeão na chupação de laranjas, chegava a pendurar quinze cascas no braço esquerdo. Para quê? Alguém descobriu que as cascas das laranjas depois de secas eram poderosos combustíveis. Elas se incendiavam com fúria à medida que produziam chamas azuis. Eu e o meu irmão Ivan nos perguntávamos: “Que substância química estará dentro das cascas das laranjas?”. Sendo tempo do desaparecimento da gasolina, chegamos a aventar a hipótese de um combustível feito a partir das cascas das laranjas. Um combustível com perfume de laranja... Terminada a chupação de laranjas, todas as cascas eram recolhidas e penduradas num varal de arame esticado sobre o fogão para secar.
Rubem Alves, "O velho que acordou menino"
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