Miguel Salas, doutor em Literatura e professor, é enfático em sua visão de vida: "Procuramos um lazer muito fácil, em troca de muito pouco, seja assistindo TV, checando o celular ou jogando com ele. Se estamos dando esse exemplo aos nossos filhos, é muito difícil que eles leiam um livro". Em uma palestra, o acadêmico dá alguns conselhos para ajudar os adultos na luta para fazer com que as crianças deixem de lado os prazeres passageiros da tecnologia e adotem o hábito tradicional da leitura.
No entanto, ele adverte que esta não é uma tarefa fácil.
— Existem causas sociais que afetam a leitura, porque exige concentração, aprofundamento e silêncio, mas a sociedade em que vivemos promove o contrário.
Partindo de sua experiência pessoal, Salas conta que seu amor pelos livros começou, como na maioria dos casos, porque sua família é muito leitora.
— Sempre tentaram promover esse amor pelos livros em casa e, no caso dos meus irmãos e no meu, conseguiram. A verdade é que gostamos de fazer isso — revela.
A razão que ele atribui à origem de sua paixão não é muito diferente da de muitos leitores amadores. Estima-se que quase 80% das crianças reconhecem que as pessoas que as incentivaram a ler foram seus familiares.
— Igualmente na idade adulta, mas sobretudo na infância, os livros são uma oportunidade de se abrir para o mundo, viver outras vidas, viajar para lugares que não se sabe localizar no mapa quando se é muito pequeno — observa Salas.
"Aprender a ler é acender um fogo, cada sílaba soletrada é uma faísca", é uma citação atribuída ao autor Victor Hugo. E o francês não está errado, através da leitura qualquer pessoa pode viajar para outros lugares e momentos da história, até mesmo ser transportado para um lugar de sonhos ou uma realidade alternativa cheia de fantasias.
— É uma possibilidade, sem sair da sua cama ou do seu sofá, de viajar para outros lugares e tempos — diz Salas.
O especialista enumera uma série de vantagens que as crianças que aprendem a ler desde cedo e desfrutam do hábito ao longo de suas vidas adquirem. Para Salas, os benefícios não são apenas a melhor compreensão da leitura e a vantagem em termos acadêmicos, mas também melhorias sociais e individuais.
Veja alguns benefícios da leitura.
Contribui para o desenvolvimento da capacidade comunicativa de forma muito importante. Uma criança que lê é uma criança que se expressa melhor e que compreende melhor;
Aumento evidente do vocabulário. De acordo com Salas, aos 20 meses de idade, uma criança em um ambiente familiar culturalmente rico domina cerca de 200 palavras. Já uma que está em um ambiente de nível sociocultural baixo domina 20;
Desenvolvimento da imaginação. Isto é fundamental porque as pessoas são muito mais audiovisuais agora e não precisam de informações para completar um cenário;
Função social. Está mais do que provado por centenas de estudos que a leitura está diretamente relacionada ao desempenho das crianças na escola;
Fomenta a empatia bem direcionada. O hábito coloca as crianças diante de um espelho e as faz entender a si mesmas através do que outros escreveram. Para Salas, uma biblioteca é uma seleção das melhores mentes da história da humanidade;
Permite se envolver e escapar. É uma atividade com "fluxo", ou seja, que é capaz de fazer com que o leitor esqueça suas preocupações e se concentre de maneira tão perfeita que é quase como se estivesse meditando.
Ele também explica que as condições atuais não favorecem que seja um hábito fácil.
— Chegamos em casa exaustos e procuramos um lazer que não nos exija muito. Então, ligamos a TV e ao mesmo tempo estamos checando o celular ou brincando com ele porque nos evadimos em troca de muito pouco — diz.
Por isso, da mesma forma que uma família estabelece horários para as refeições, estudar ou trabalhar, Salas sugere fazer o mesmo com a leitura.
— Meia hora de leitura por dia, cada um com um livro. Mas além disso, temos um momento para o jantar, outro para o esporte, as tarefas e assim por diante. Só é necessário meia hora por dia, não é necessário mais — aconselha.
Leituras recomendadas para iniciar as crianças
Salas sugere uma série de livros que, baseado em sua experiência com crianças, sempre funcionam: livros escritos por Arthur Conan Doyle como Sherlock Holmes; Os Três Mosqueteiros ou O Conde de Monte Cristo de Alexandre Dumas; as obras de Jane Austen que são da literatura do século XVIII e que, além disso, têm um tom sentimental que os jovens adoram.
Quando uma criança ou adolescente pergunta "o que posso ler?" deve ser levado a sério porque, nas palavras do especialista, isso pode mudar suas vidas.
Por último, cita o poema "Los Justos" do argentino Jorge Luis Borges que costuma recitar para seus alunos do ensino médio quando estão angustiados com a carreira, o ensino médio, a vocação ou o sentido da vida.
Diz assim: "Um homem que cultiva seu jardim, como queria Voltaire. Aquele que agradece que na terra haja música. Aquele que descobre com prazer uma etimologia. Dois empregados que em um café do sul jogam um silencioso jogo de xadrez. Um ceramista que premedita uma cor e uma forma. O tipógrafo que compõe bem esta página, que talvez não lhe agrade. Uma mulher e um homem que leem os tercetos finais de certo canto. Aquele que acaricia um animal adormecido. Aquele que justifica ou quer justificar um mal que lhe fizeram. Aquele que agradece que na terra haja Stevenson. Aquele que prefere que os outros tenham razão. Essas pessoas que se ignoram estão salvando o mundo".
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