Fazer uma antologia que traga no título a expressão “Os Melhores…” é (diria o dr. Machado Penumbra) mergulhar no paradoxo e se expor ao vitupério. Tudo que não é quantificável, como é o caso da qualidade literária, fica sujeito ao que a linguagem popular denomina de “gosto”, um nó-górdio que não se deslinda e só se pode cortar com a frase (talvez inventada por Seu Lunga) “gosto não se discute”.
A função de um antologista ou de um crítico os obriga a equilibrar o seu gosto com um conjunto diferente de expectativas. Sua leitura, sem deixar de ser uma leitura pessoal, tem também uma visão coletiva, porque sua função naquele momento tem algo de normativo, de definidor de parâmetros. Uma antologia que usa a expressão “Os melhores…” tende a transformar seus contos em sinalizadores. Os escolhidos de hoje são os imitados de amanhã. Em casos assim, a preferência pessoal dá um passo atrás e cede a vez a uma preocupação mais ampla. O crítico não está premiando unicamente o que lhe agrada, mas o que lhe parece mais necessário e mais enriquecedor para o conjunto da literatura, naquele momento específico.
A antologia “Os Melhores Jovens Escritores Brasileiros”, organizada pela Editora Alfaguara e revista Granta, definiu uma série de limites para participação (autores até 40 anos, com pelo menos um conto publicado, que enviassem um conto inédito). Recebeu 247 originais, e os sete jurados (entre os quais há amigos meus) escolheram 20. Mesmo considerando que estes 20 fossem superiores aos 227 restantes, é perfeitamente justo imaginar que existem no Brasil outros 20 autores, ou outros 200, igualmente bons e que por alguma razão não se inscreveram. (Não li a antologia, e não tenho motivos para supor que os contos não sejam bons.)
Quando organizei minha antologia “Páginas de Sombra – Contos Fantásticos Brasileiros”, um amigo me sugeriu que incluísse no título o trmo “melhores”. Respondi que não podia considerar aqueles 16 contos os melhores de nossa literatura fantástica, até porque seria impossível ler e comparar os milhares de candidatos; e um leitor de bom senso iria considerar que ninguém incluiria numa antologia um conto que não merecesse ser lido. “Bobagem”, disse ele, “tanto faz.
O público quer ter a ilusão de estar levando para casa o melhor produto, porque há cem anos as agências de publicidade lhe vendem a melhor cerveja, o melhor pneu, o melhor plano de saúde ou de telefonia. Ele precisa da ilusão de que está comprando ‘o melhor’, mesmo que isto lhe seja dito pelo próprio fabricante”. Toda antologia que anuncia “Os Melhores” está com um pé na crítica literária e o outro na propaganda.
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