Então suprimiram-se os relógios, as agendas e os calendários. Foi eliminado o ensino de História. Para que História? Se tudo era a mesma coisa, sem perspectiva de mudança.
A duração normal da vida também foi prorrogada e, porque a morte deixasse de existir, proclamou-se que tudo entrava no regime da eternidade. Aí começou a chover, e a eternidade se mostrou encharcada e lúgubre. E o seria para sempre, mas não foi. Um mecânico que se entediava em demasia com a eternidade aquática inventou um dispositivo para não se molhar. Causou a maior admiração e começou a recolher inúmeras encomendas. A chuva foi neutralizada e, por falta de objectivo, cessou. Todas as outras formas de duração infinita foram cessando igualmente.
Certa manhã, tornou-se irrefutável que a vida voltara ao signo do provisório e do contingente. Eram observados outra vez prazos, limites. Tudo refloresceu. O filósofo concluiu que não se deve plagiar a eternidade.
Carlos Drummond de Andrade, “Contos Plausíveis”
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