sábado, abril 4

Os velhos são boa gente

Condenados à inutilidade, os velhos estão sempre pesando. Sofrem rejeição sob vários aspectos. Saber que a vaga já está preenchida por outro em razão da idade mais moça, não é nada agradável.

Não existe imagem única sobre a velhice. Cada pessoa envelhece como viveu. Existem maneiras de envelhecer. De todos os males que chegam com a velhice, a falta do que fazer parece ser o pior, o mais temido inimigo. Conheci uma criatura que teve de parar de repente, depois de quarenta anos de atividade ininterrupta. Foi como uma morte. Ficava em estado lastimável. Vagava pela casa, de péssimo humor, implicante e deprimido. Só venceu a crise depois que encontrou uma atividade. Mas sabemos que essa alternativa nem sempre ocorre.

Num mundo dirigido e feito para jovens, onde se vê forte obsessão pela sensualidade, sendo supervalorizadas a beleza física e a juventude, o que fazer com essa gente velha? Cumprida a função na família, peso inútil na comunidade, mais nada a esperar da vida, de repente cada um se vê sozinho. A família em geral repugna a solução de um asilo de velhos, sinônimo de abandono e solidão. Alguns povos do passado costumavam abandonar gente idosa da comunidade num lugar deserto. Entre nós, hoje, o que devemos fazer com os nossos velhinhos?


O ideal seria a criação de um centro comunitário, onde eles se sentissem em família, tivessem ali todo o conforto e assistência. Fosse então erguida a vila, construída de preferência para o nascente, talvez numa colina onde a vista desse para o mar. Receberiam o espetáculo do nascer do sol ou da lua cheia derramando prata nas ondas do mar. Não faltariam na vila árvores frondosas e frutíferas, passarinhos que em alarido viriam saudar os hóspedes todas as manhãs. Não poderiam deixar de faltar jardins com flores. O perfume serviria para suavizar o coração acordado na lembrança. A vila seria um pedaço do céu. Não haveria lugar para a tristeza, música lá só alegre, aconselhável que fosse entoada pelos hóspedes. Ninguém teria vergonha de mostrar o seu talento nessas horas. Quem soubesse tocar algum instrumento tocava. Com o maior prazer seriam atendidos os pedidos de bis que a plateia entusiasmada reclamasse. Quem fosse poeta, querendo declamar seus versos queridos, declamava.

A vila teria quartos com janelas de claridade e vento amigo. Refeitório amplo, salas de televisão, para reuniões, capela e um pequeno teatro. O horário para as refeições seria flexível. Os hóspedes seriam livres para agir como quisessem durante o dia. Quem não quisesse sair, poderia ficar conversando no papo amigo ou se ocupando em fazer algum trabalho manual que lhe desse prazer. Os aniversários seriam comemorados como um momento especial, muito doce, naquele tom afetivo que costuma acontecer em família. A vida passaria sem que se desse conta, no enlace dos dias com amor. E o que você acha desse lugar idealizado assim para esses bons velhinhos seja chamado A Barca Boa da Felicidade?

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