O título não idolatra o passado. Cada época tem graças e desgraças. Existem lapsos de tempo em que as civilizações brilham. Na Europa, a Belle Époque, (1870), apesar dos guerras mundiais, deixou traços indeléveis da Art Nouveau, do impressionismo e fortes marcas da cultura cosmopolita e hedonista.
No Brasil, estes anos dourados atingiram, de modo expressivo e diferenciado, Manaus, Belém, São Paulo, Minas, Salvador, Recife e o Rio de Janeiro, locomotiva dos novos tempos, encantadora e poderosa, tornou-se a eterna “Cidade Maravilhosa” batizada pelo escritor maranhense, Coelho Neto, transformada em hino pelo compositor André Filho.
Sinto falta do Brasil acolhedor, solidário, inspirado no humor irreverente. Este sentimento explodiu quando li "Vento Vadio – As crônicas de Antônio Maria", (Todavia, 2021) débito impagável com Guilherme Tauil (das 185, 132, inéditas). Hoje, o País está intoxicado pelo ódio.
Maria foi um “multimídia” avant la lettre. Teve o destino dos cometas hiperbólicos: brilho intenso e pouca duração. Morreu fulminado por um enfarte, em “casa”, a calçada de uma rua de Copacabana aos 43 anos (15/10/64, madrugada), como previra. Era um “cardisplicente”, distribuído no corpanzil de 1,80 e 120 quilos.
Filho de usineiro, abreviou outro destino: “Pai rico, filho nobre e neto pobre”. O pai especulou com o preço do açúcar: perdeu tudo. Com u´a mão na frente e outra atrás, Maria correu atrás do “pão dormido”: Recife/Rio/Recife/, Fortaleza, Salvador e Rio, seu palco iluminado.
O Rio de Janeiro atraia gente do Brasil inteiro. Muitos nordestinos. Maria, pernambucano, dividiu apartamento com os conterrâneos Fernando Lobo e Augusto Rodrigues. Aprontaram. Depois de muitos goles, disputaram uma prova de natação na banheira. Apartamentos inundados e os três despejados.
Os quatro verbos de Maria: amar, sofrer, esquecer e se divertir. O biógrafo Joaquim Ferreira dos Santos (Um Homem chamado Maria, Objetiva, Rio de Janeiro, 2006) relata fielmente a vida naquela época como uma aventura de apaixonados, encoberta pela frase imortal do biografado: “A noite é uma criança”.
Ele torrava o maior salário da TV Tupi: 50 mil cruzeiros. Liso, comprou um Cadillac, carro chique, apartamento improvisado e espaço para escrever textos.
Sedutor irresistível. O antigalã sabia escutar as mulheres. O sucesso “Ninguém me ama” era um apelo infalível. Viveu três anos com a belíssima Danuza Leão, ex-mulher do patrão.
Seus frevos poéticos fizeram de Maria, Patrono da Academia Pernambucana da Boemia composta por “[…] trinta homens sentados […] trinta copos de chope, trezentos desejos presos, trinta mil sonhos frustrados”.
Gustavo Krause
Nenhum comentário:
Postar um comentário