Um episódio picante foi também o ocorrido com o duque de Gloucester, irmão do rei Jorge III, a quem o grande historiador Edward Gibbon ofereceu o primeiro volume da sua hoje famosa The History of the Decline and Fall of the Roman Empire. Quando o segundo volume desta obra apareceu, julgou apropriado oferecê-lo também ao duque. Este recebeu o volume com afabilidade, mas com estas palavras de algum fastio: “Mais um calhamaço chato! Sempre a escrevinhar, a escrevinhar, a escrevinhar! Eh, Mr. Gibbon?” A relação dos “royals” com o livro não foi nunca de grande empatia… E há muita gente para quem o livro é apenas aquilo de que se faz um filme para a televisão ou para o cinema. Por outro lado, há os que, como o poeta galês, Dylan Thomas, leram apaixonada e indiscriminadamente até os olhos lhes saltarem das órbitas (palavras do próprio Thomas). No outro extremo, estão os que perseguem o livro, proibindo-o ou queimando-o. Um exemplo de instituição encarregada de censurar livros foi o Index Librorum Prohibitorum, estabelecido pela Igreja Católica, em 1559. Entre os grandes escritores “apanhados” na rede persecutória do Index, estão Bacon, Milton, Locke, Daniel Defoe, Richardson, Hume, Sterne, Goldsmith, Descartes, Montaigne, Spinoza, Rousseau, Pascal, Kant, Stendhal, Hugo, Balzac, Casanova, Dumas, Flaubert, Zola, Gide, Sartre e Moravia, entre outros.
Nem sempre foi precisa a inquisição católica, para se perseguir, com eficácia, o livro. A rainha Isabel I, que não gostava da cena, na peça Richard II, de Shakespeare, na qual o rei é deposto, mandou “apagá-la” em todos os exemplares da obra. E, entre 1788 e 1820, o King Lear foi proibido nos palcos ingleses, para não se fazer a ligação entre a peça e a loucura do rei Jorge III.
No primeiro quartel do século XX, a Watch and Ward Society, em Boston, fez também uma razia censória, de que uma das vítimas foi o grande dramaturgo americano Eugene O’Neill: o censor foi, para o caso, um primo do presidente da câmara, que, tendo perdido um braço, se viu despedido do seu emprego de tocador de tambor, pelo que obteve o trabalho de censor.
Mas a suprema forma de censura ao livro é a queima na praça pública. Os nazis foram magníficos incendiários de livros de que não gostavam e não convém também esquecer os bombeiros incendiários de livros, do famoso romance Fahrenheit 451, de Ray Bradbury. Mas os nazis não inventaram nada: a queima de livros vem de tempos muito remotos, não é uma invenção do século XX. Os Analectos, de Confúcio, foram queimados (c. 240 A.C.) e centenas dos seus discípulos enterrados vivos. Em 1497, as obras de Ovídio, Propércio, Bocaccio, Dante e outros foram queimadas pelo monge Savonarola, na grande “Fogueira das Vaidades”, de Florença; em 1521, as obras de Martinho Lutero foram destruídas pelo fogo, por ordem do Papa Leão X; em 1599, as obras de Ovídio viram a fogueira, em Londres; em 1660, as Lettres à un Provincial, de Pascal foram incineradas por ordem de Luis XIV; as Lettres Philosophiques e o Temple du Goût, de Voltaire viram a fogueira em 1734; em 1795, as obras de Cagliostro foram devidamente queimadas.
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