De onde, então, Malu tirou a ideia de que é uma rainha, ninguém sabe. O fato é que desde os dois anos ela é mandona, respondona, majestática. Quer tudo, exige tudo, e que nem pensem em contrariá-la: ela esperneia, grita, xinga e despeja sobre os desobedientes sua ira régia.
Esses acessos, que felizmente são apenas dois ou três por dia, a fizeram ser conhecida, na família e até fora dela, como Rainha Maria Lúcia. Às vezes, esse tratamento assume um tom jocoso, e até depreciativo. Malu, porém, não dispensa nenhuma das prerrogativas que o título lhe concede.
Entrou compenetrada – era a primeira vez que ia lá – e começou a observar, com sua sobriedade de rainha, as tartarugas, os polvos, as lagostas, os tubarões. Enquanto as outras crianças, em alegres tropelias, enchiam o imenso aquário de exclamações de júbilo, de surpresa, de admiração e de medo, ela olhava tudo como se já conhecesse aquilo desde antes de nascer. Parecia uma senhora de 60 anos examinando uma coleção de tecidos raros com um pincenê.
O pai e a mãe, quando ela disse que queria ir embora, se olharam, decepcionados: ela não tinha gostado. Por isso, foi enorme a surpresa deles quando a pequena rainha, assim que saíram do aquário, determinou:
“Eu quero um pinguim.”
Diante do aquário, uma banca de camelô exibia miniaturas de animais marinhos. O dono da banca estava conversando com um vendedor de sorvetes e foi seu filho, um garoto de uns dez anos, quem atendeu a menina. Pegou um pinguim grande e um pequeno e os mostrou a ela.
“Um de verdade”, disse Malu.
“O quê?”, perguntou o pai.
“Eu quero um de verdade”, respondeu Malu, mexendo-se inquieta no colo dele.
O menino ofereceu de novo o pinguim grande e o pequeno.
“Eu disse de verdade”, berrou a jovem rainha, dando um tapa que jogou os dois pinguins ao chão.
Enquanto Malu, o pai e a mãe se afastavam, o dono da banca puxou o filho pela orelha:
“Menino burro! Nunca você vai aprender a trabalhar.”
O garoto pensou nos amiguinhos, que naquele momento deviam estar vagabundeando, jogando bola e atirando pedras em vidraças, e recolheu os pinguins com uma revolta que o fez desejar que a menina riquinha quebrasse as pernas, os braços, os dentes. Quem ela pensava que era? Uma rainha?Raul Drewnick
Nenhum comentário:
Postar um comentário