A série que prologo e que já entrevejo quer dar esse prazer. Não escolherei os títulos em função dos meus hábitos literários , de uma determinada tradição, de uma determinada escola, de tal país ou de tal época.
" Que outros se gabem dos livros que lhes foi dado ler", disse eu uma vez. Não sei se sou um bom escritor ; penso ser um excelente leitor ou, em todo o caso, um sensível e agradecido leitor. Desejo que esta biblioteca seja tão diversa como a não saciada curiosidade que me induziu, e continua a induzir-me, à exploração de tantas linguagens e de tantas literaturas. Sei que o romance não é menos artificial do que a alegoria ou a ópera , mas incluirei romances porque também eles entraram na minha vida. Esta série de livros heterogêneos é, repito, uma biblioteca de preferência.
Maria Kodama e eu erramos pelo globo da terra e da água. Chegamos ao Texas e ao Japão, a Genebra , a Tebas, e, agora para juntar os textos que foram essenciais para nós , percorreremos as galerias e os palácios da memória, como escreveu Santo Agostinho.
Um livro é uma coisa entre as coisas , um volume perdido entre volumes que povoam o indiferente Universo, até que encontra o seu leitor , o homem destinado aos seus símbolos. Acontece então a emoção singular chamado beleza, esse mistério belo que nem a psicologia nem a retórica decifram. " A rosa é sem porquê" , disse Angelus Silesius ; séculos depois Whistler declararia " A arte acontece".
Oxalá seja o leitor que este livro aguardava.
Jorge Luís Borges, " Biblioteca Pessoal"
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