Se frequentar as lojas Glória era um momento de festa, pelo demasiado esforço para convencer a mãe na empreitada daquela pequena jornada, um grande passeio da existência infantil… Dobrando quarteirões desconhecidos, do centro seguro e calmo do bairro rumo às perturbadoras e desconhecidas avenidas, em um movimento que traga, que altera, ao ir lentamente abandonando a seguridade da família. Apenas uma movimentação falseada pelas ruas de casas decrépitas e calçadas irregulares, ou um cisco penetrar na órbita do olho depois de uma ventada na tubulação deserta do caminho passado, são necessários para adentrar ou não na espacialidade dos magazines.
Nunca vira ruas como aquelas, em que há dois ou três degraus de calçada (como proteção de enchentes?), antes da porta de entrada dos casebres, na condolência de caminhos planos e muito retos, no decorrer da inteireza de um meio de tarde, espaço entretempos que a cada dia redivive uma feição infinita. Mas se eu tivera estacado no caminho das lojas Glória ou parasse em frente à loja, a espera de algo além, tendo levado para mim uma ou outra coisa, que nem mais existe ou quedou inútil…
Agonizantes casas que amei sem conhecer, que mesmo delas nada sei além das fachadas carcomidas, entretanto, de uma beleza que passo a crer que fui eu que melhor a vi, enxerguei e reconheci. Estranha prepotência da qual poderiam escarnecer, devaneios de loucos, julgar-se o que mais e melhor amou, o mais apto a dar e a receber, e aquele que merecia as uvas. Mas não me condeno pois isso consiste em visionamento opaco, fato internalizado. Esperaria, portanto, pela sua agonia final? Ou uma transformação em coisa tão diversa que nem mesmo mais me interessaria por elas em sua nova roupagem?
A vida como um movimento em falso e descaso – para ir em frente, se dissuadir de grandezas e sentimentos, para ir adiante, e encontrar outras larguezas de avenidas, magazines amplos. Mas que outros? Com qual amplitude? Apenas mais outros? Essas lojas Glória, por sobre aqueles olhos por cima do vidro do carro, pareciam algo tão glorioso. No entanto, anos depois passo rapidamente em frente, e vejo um galpão tão sinistro, escuro, talvez abandonado. Eu não sabia que poderia caber uma tamanha feiura naquele lugar, e que não me pertenceriam aqueles caminhos em mais nenhuma hipótese. Acaso precisaríamos jogar sujo, demonizar, para colocar em seu devido lugar o divinizado?
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